1. 1987-09-13
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Césio 137: um pesadelo que assustou a indústria

No final dos anos 1980, Goiânia foi palco da tragédia do Césio 137. Além do preconceito, a indústria goiana foi abalada, mas logo esta imagem foi recuperada.

História de Goiás

O início

Uma tragédia que causou 4 mortes, 151 pessoas contaminadas gravemente, 1.143 pessoas afetadas e 112.800 pessoas obrigatoriamente monitoradas na tentativa de detectar contaminação por uma substância aparentemente inofensiva chamada Césio 137. Tudo começou em Goiânia, 13 de setembro de 1987, quando dois catadores de reciclagem retiram parte de um aparelho de uma clínica abandonada, o Instituto Goiano de Radioterapia e começam a desmontar a peça. Cinco dias depois vendem a peça para um ferro velho e o dono, Sr. Devair Ferreira chama dois funcionário para abrir, a marretadas, o cabeçote de chumbo e lá encontra uma cápsula com aproximadamente 19 gramas de um pó esbranquiçado durante o dia e azul luminoso à noite. Ao ter contato com a substância ainda desconhecida, Devair começa a passar mal, e seu irmão Ivo ao visitar o ferro velho, levou um pouco do pó para casa, e sua filha Leide das Neves brinca com o pó que chama muita atenção pelo brilho marcante no escuro. No dia seguinte, a menina de apenas seis anos de idade começa a passar mal. Maria Gabriela, esposa de Devair começa a se preocupar com a situação e resolve levar a peça contendo o pó para a vigilância sanitária onde um físico, utilizando detector de fontes radioativas, percebeu o altíssimo nível de contaminação e descobre que uma capsula localizada no interior de um aparelho utilizado em radioterapia havia sido violada dando acesso a um pó altamente radioativo chamado Césio 137. As pessoas que tiveram contato com o material e apresentaram sintomas, foram imediatamente encaminhadas para o Rio de Janeiro na tentativa de conter a radiação, mas no dia 23 de outubro Maria Gabriela de 37 anos e Leide das Neves, 06 vieram a óbito, no dia 27, outra vítima fatal, Israel Batista e um dia depois Admilson Alves também perde a vida vítima da contaminação. Estas foram as quatro únicas vítimas fatais. A capital goiana entrou em pânico, pois ninguém sabia se estava contaminado ou não, ninguém sabia de informações mais claras e precisas, e a mídia da época gastou muito tempo propagando o caos instaurado em rede nacional.

O impacto na indústria

Na região onde a capsula foi aberta, e onde foram contaminadas as primeiras pessoas, começa-se um êxodo, cai o valor dos imóveis, comércios são fechados e o preconceito contra pessoas da região é declarado. Pela proporção da fatalidade, o país inteiro soube de tal acontecimento e pessoas de Goiás, em especial de Goiânia que viajavam para outros Estados da Federação, eram tratados com indiferença e preconceito, pois para estas pessoas, Goiás tornou-se um Estado “leproso”, onde para eles era um perigo ter contato com pessoas da capital. Claro que isso foi um exagero por parte das pessoas em virtude da mídia ter propagado de forma tão aterrorizante as notícias do acidente radiológico de Goiânia.

O empresário Sr. Cyro Miranda Gifford Júnior, em seu depoimento ao Memorial da Indústria, comenta no final de sua fala sobre a tragédia do césio 137. Segundo ele, foi um fato que prejudicou a economia goiana, pois empresas de outros Estados classificaram Goiás (em especial Goiânia) um local perigoso devido à contaminação do incidente. Empresários e industriários com esforços somados, conseguiram reverter esta situação, pois a mídia local e nacional não colaborou em desmistificar a falácia que Goiânia não seria um bom lugar para prática de negócios, compra, venda e investimentos pelo fato da contaminação. Para quem estava de fora, e não sabia exatamente detalhes sobre o infortúnio, Goiânia ficou sendo considerada a “Chernobyl goiana”, mas graças aos esforços destes empresários, essa ideia foi contrariada. Também por conta de boatos e informações cruzadas, os brasileiros criaram um preconceito para com o Estado de Goiás. O turismo goiano sofreu queda e o setor de hotelaria em cidades turísticas houve ocorrências de cancelamentos nas reservas, voos também foram cancelados e na capital houve diminuição de setores varejistas, principalmente nas áreas próximas ao ocorrido, várias empresas que compravam produtos agropecuários oriundos de Goiás passaram a cancelar pedidos. Vários segmentos da sociedade civil começaram a se mobilizar para tentar reverter a “imagem” de Goiânia e o Governador do Estado de Goiás na época, Henrique Santillo que através de um programa de TV local, fez um apelo a toda sociedade para que unissem forças em solidariedade para vencer o preconceito e convocou a FIEG – Federação das Indústrias no Estado de Goiás, sindicatos, associações, entidades, órgãos públicos estaduais e municipais para que cada um em seu setor cooperasse de alguma forma para mudar o cenário. Várias empresas também promoveram palestras aos funcionários com temas que esclareciam o que era na verdade o césio 137, os riscos, também com objetivo de esclarecer inverdades sobre o acidente radiológico e a respeito das reais dimensões do fato.

O final da década de oitenta foi realmente um período difícil para Goiás que além do acidente radiológico ocorrido, o cenário político brasileiro passava por grandes mudanças e transições. Neste intervalo o Estado de Goiás estava em crescimento industrial e começava a se destacar no cenário nacional e graças à colaboração das entidades civis, Goiás retomou seu crescimento e até hoje continua a crescer.

Texto: Valter Lopes - Historiador

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FONTES
JUNIOR, Eurípedes Monteiro de Oliveira. O grande medo de 1987: uma releitura do acidente com o césio-137 em Goiânia. 2016. 217f. Tese (Pós-graduação em História) – Universidade de Brasília, Programa de Pós-graduação, Brasília.
CHAVES, Elza Guedes. Atos e omissões: acidente com o Césio 137 em Goiânia / Elza Guedes Chaves. - Campinas, SP : [s.n.], 1998. Tese (Doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas.
SANTILLO, Henrique. Reportagem/entrevista Césio 137. Prod. TV Brasil Central, 1987. Acervo Museu da Imagem e do Som – GO.
CÉSIO 137 o pesadelo de Goiânia. Direção de Roberto Pires. Salvador: Grupo Coplaven, 1990. 1 DVD (115 min.) color.
BORGES, Rogério. Césio 137 1987-2017: 30 anos do pesadelo azul. O Popular, Goiânia, 10 set. 2017. Artigo, p. 9.
BORGES, Weber. Eu também sou vítima / Weber Borges – Goiânia: Kelps, 2003. 386p.

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